Dúvida frequente no momento da contratação de plano de saúde é se a escolha pelo regime de co-participação nas despesas é a melhor opção, considerando que as mensalidades são bem menores do que nos planos sem co-participação.

Destaco que a venda de planos e seguros de saúde que obrigam o consumidor a arcar com parte das despesas com a assistência à saúde é autorizada pela lei 9.656/98, que determina, ainda, em obediência ao direito básico do consumidor à informação clara e adequada, que seja fixado, no instrumento contratual, a exata medida da co-participação do consumidor nestas despesas.

Em geral, esse tipo de contrato é mais benéfico para os mais jovens, para quem não usa muito o plano ou para quem não está realizando algum tratamento, já que, fora dessas circunstâncias, as despesas assistenciais serão maiores e, consequentemente, maior será o valor da co-participação.

Embora prevista em lei, a pactuação da co-partcipação não pode ser estabelecida em percentual sobre o custo do tratamento, sob pena de afronta ao art. 51, do CDC. A reforçar esse entendimento, a Resolução CONSU n. 08, que prevê, em seu artigo 4o, inciso VII, a necessidade de fixação em valor fixo da co-participação, evitando que a co-participação constitua um entrave à utilização do serviço ou impeça o acesso do segurado aos tratamentos estipulados.

Os tribunais brasileiros já tiveram a oportunidade de analisar pedidos de nulidade de co-participação em contratos de assistência à saúde. O entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por exemplo, bem enfrentou a matéria e decidiu a favor do consumidor. A Ilustre relatora desembargadora Dr. Isabel Dias Almeida, ao julgar a apelação cível n. 0529401-26.2013.8.21.70002, com sabedoria, afirmou: “(…) Não sendo juridicamente viável limitar o tempo de internação, por exemplo, ou o tratamento indicado pelo médico assistente, tenho por abusiva a cláusula contratual que prevê a co-participação do usuário nas despesas daí decorrentes quando ultrapassada essa determinada previsão limite para a cobertura. Ou seja, havendo a cobertura para a enfermidade, descabe limitar o tratamento da recuperação do paciente, como se dá na hipótese em comento, onde lhe é exigida a co-participação em percentual sobre os gastos sabidamente excessivos. (…)”.

Outros julgados caminham no mesmo sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. CLÁUSULA DE CO-PARTICIPAÇÃO. PERCENTUAL SOBRE O VALOR DO TRATAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. 1. Todo e qualquer plano ou seguro de saúde está submetido às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços médicos. Inteligência da Súmula n. 469 do STJ. 2. Em que pese o artigo 16, inciso VIII, da Lei 9.656/98 estabeleça a possibilidade de co-participação do usuário nas despesas médico-hospitalares e ainda não exista proibição no Código de Defesa do Consumidor, inviável a exigência de participação do segurado prevista em percentual sobre o valor das despesas de tratamento, posto que totalmente abusiva e em dissonância com o estabelecido no art. 51, inc. IV do CDC. (…) RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70055455562, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sergio Luiz Grassi Beck, Julgado em 11/09/2013) [grifei]

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO. PLANO DE SAÚDE. RADIOTERAPIA MODULADA DE FEIXE (IMRT). AUSÊNCIA DE CLÁUSULA DE EXCLUSÃO DE COBERTURA. APLICAÇÃO DOCÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DEVER DE INFORMAR. REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO EM HOSPITAL NÃO CONVENIADO. AUSÊNCIA DE LOCAL APTO A REALIZAR O PROCEDIMENTO NA ÁREA DE ABRANGÊNCIA. CO-PARTICIPAÇÃO. PERCENTUAL SOBRE O TRATAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1.O contrato de seguro ou plano de saúde tem por objeto a cobertura do risco contratado, ou seja, o evento futuro e incerto que poderá gerar o dever de indenizar por parte da seguradora. Outro elemento essencial desta espécie contratual é a boa-fé, na forma do art. 422 do Código Civil, caracterizada pela lealdade e clareza das informações prestadas pelas partes. 2.Há perfeita incidência normativa do Código de Defesa do Consumidornos contratos atinentes aos planos ou seguros de saúde, como aquele avençado entre as partes, podendo se definir como sendo um serviço a cobertura do seguro médico ofertada pela demandada, consubstanciada no pagamento dos procedimentos clínicos decorrentes de riscos futuros estipulados no contrato aos seus clientes, os quais são destinatários finais deste serviço. Inteligência do art. 35 da Lei 9.656/98. Aliás, sobre o tema em lume o STJ editou a súmula n. 469, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde. 3.Não há qualquer referência expressa no contrato entabulado entre as partes de exclusão de cobertura de radioterapia modulada de feixe (IMRT). 4.Restrições de direito devem estar expressas, legíveis e claras no contrato, o que não ocorreu no caso em tela, em afronta ao dever de informar consagrado na legislação consumerista. Ressalte-se que a vedação de cobertura não consta taxativamente no contrato, e cláusulas restritivas de direito não dão margem a interpretações extensivas. 5.A omissão no contrato quanto à exclusão de cobertura deve ser interpretada de forma favorável ao consumidor, uma vez que a negativa do apelante não se pautou em determinação contratual. Inteligência do art. 47 do Código de Defesa do Consumidor. 6.Inexistente unidade médica apta a prestar o atendimento dentro da denominada área de abrangência, o usuário pode buscar assistência à saúde fora desta, sendo desnecessário, nesse caso, que utilize a rede credenciada, até porque o rol de referenciados está limitado à área de abrangência do plano. 7.Não há proibição no Código de Defesa do Consumidor ou em qualquer legislação específica sobre a possibilidade de exigência de participação do usuário nas despesas médico-hospitalares.Contudo, a participação do contratante não pode ser estabelecida em percentual sobre o valor das despesas com o tratamento. 8.A celebração de um contrato de plano de saúde visa a socializar o risco de eventuais atendimentos médico-hospitalares, os quais, não raras vezes, possuem custos elevados. Assim, a exigência de percentual sobre o valor da assistência prestada poderia impedir o beneficiário de utilizar o contrato ou mesmo onerá-lo sobremaneira com despesa que, por meio do ajuste, pretendia se resguardar. 9.Ademais, considerando as peculiaridades deste contrato, a co-participação deve ser entendida como forma de moderar a utilização do plano, ou seja, de inibir uso excessivo e sem critério das coberturas garantidas no pacto. No entanto, não pode impedir a concretização da finalidade precípua daquele, qual seja, a de precaver-se de evento futuro e incerto. 10.Além disso, esta forma de estipulação da participação do usuário é vedada pela Resolução nº. 08 da ANS, a qual dispõe sobre mecanismos de regulação nos Planos e Seguros Privados de Assistência à Saúde. Negado provimento ao apelo. (Apelação Cível Nº 70054604095, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 31/07/2013)

 

Por Melissa Areal Pires

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