Destaca-se, preliminarmente, que o mercado imobiliário brasileiro viveu a última década de muito dinamismo e passou por duas fases bastante distintas.

A primeira, acompanhando o ciclo econômico do país em alta, experimentando um forte crescimento e registrou o auge da prosperidade. No entanto, com a desaceleração da economia brasileira nos últimos anos, entrou em uma curva descendente significativa, confirmando uma segunda fase.

Há de se ressaltar que em 2008, a crise imobiliária dos Estados Unidos refletiu de forma negativa em todo o mundo, e foi justamente neste pós-crise que a economia brasileira começou a dar sinais de prosperidade e o mercado imobiliário seguiu a mesma tendência.

De acordo com levantamento global feito em 54 países pelo Banco de Compensações Internacionais (BID, na sigla em inglês) no ano de 2016, a valorização imobiliária no Brasil foi de 121% nos cinco anos seguintes ao período pós-crise de 2008. Ou seja, entre os anos de 2008 e 2011, a valorização anual ficou acima dos 20%.

Nos termos do Economista Marcelo Barros, o mesmo afirma que: “Acompanhando a valorização imobiliária também houve a expansão significativa no crédito para aquisição de imóveis. E a alta demanda pressionou também a valorização dos preços dos imóveis”.

Além disso, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), houve um incremento de 42% no volume de financiamentos para construção e compra de imóveis em 2011 comparado com 2010, somando R$ 79,9 bilhões.

Assim, foram financiadas 493 mil unidades no ano de 2011, 17% a mais que o ano anterior, leia-se 2010, resultando no índice de 26% de aumento nos valores de imóveis, de acordo com o Índice FipeZap.

Como a economia se manteve em uma crescente, com baixo desemprego, crescimento da renda e baixa inadimplência, a liberação do crédito imobiliário continuou em expansão nos anos seguintes.

Em 2013, os números bateram recorde, atingindo R$ 109,2 bilhões, 32% a mais do que no ano anterior (2012), de forma que foram financiados 529,8 mil imóveis, alta de 17% ante os 453,2 mil.

No entanto, em 2013 o cenário econômico começou a apresentar uma realidade distinta, como afirma o Economista Marcelo Barros: “Porém, a partir de 2013, a economia começou a dar sinais de desaquecimento e começou um novo cenário com uma curva descendente, principalmente em 2015”.

Em 2014, ano da Copa do Mundo no Brasil, foram realizadas muitas obras de infra-estrutura nas cidades-sede acarretando a valorização de bairros mais próximos de onde essas melhorias foram feitas. No entanto, já se ouvia falar em supervalorização dos preços dos imóveis e na construção desalecerada para se adequar à demanda.

Pois bem, em 2014, já não foi registrada tanta alta nos financiamentos, segundo a Abecip, que registrou o financiamento de 538,3 mil unidades, encerrando o ano em estabilidade, com aumento de 1,6% em relação a 2013.

Porém, somando todo o período o número representa um crescimento de quase 800% em nove anos até 2014. Em relação aos números, os financiamentos somaram R$ 113 bilhões e o incremento de 5,3% sobre o ano anterior se deu graças ao aumento dos preços.

No entanto, em 2015, aconteceu o esperado, ao passo que houve um agravamento na situação do mercado imobiliário brasileiro, puxado pelo enfraquecimento na economia nacional, além das incertezas políticas.

Nesta linha, afirmou Eduardo Zylberstajn, coordenador do Índice FipeZap “Se no primeiro momento, em um ciclo econômico crescente havia crédito imobiliário mais barato e uma demanda em alta, agora houve uma inversão desses fatores, já que os juros estão altos e o crédito mais escasso”.

Assim, em 2015 as taxas de juros para financiamento de imóveis tiveram um aumento por conta da grande retirada da caderneta de poupança e os depósitos mais limitados nesta que é a maior fonte de financiamento imobiliário do país.

Soma-se a isso a instabilidade da economia brasileira e do cenário político, como afirma o coordenador do Índice FipeZap: “O desemprego e a inflação estavam em alta e é preciso lembrar que o crédito imobiliário é de longo prazo e, com qualquer instabilidade, as pessoas tendem a adiar o projeto da casa própria”.

Além disso, foram implementadas mudanças nas regras de financiamentos e para os imóveis usados o limite de financiamento passou de 80% para 50%, obrigando consumidor a dar uma entrada maior.

Segundo dados da Abecip, os financiamentos alcançaram R$ 75,6 bilhões no ano de 2015, uma queda de 33%, tendo, financiadas 342 mil unidades, devido à baixa nas vendas e nos lançamentos.

O resultado final é que, em 2015, o preço dos imóveis no Brasil teve queda real, já que houve a valorização de 1,32%, aumento que ficou abaixo da inflação registrada no ano.

Este efeito foi explicado pelo Economista Marcelo Barros, nas seguintes palavras: “As incorporadoras realizaram promoções, ofereceram descontos e tiveram menos lançamentos, já que o mercado estava relativamente parado”.

A economia brasileira ainda está bastante instável, o que influencia negativamente o mercado imobiliário. “O setor depende de como está o cenário do país e não dá para falar em uma melhora econômica. E o cenário de instabilidade na política também contamina a confiança”, reforça Eduardo.

Isso significa que a dinâmica econômica é um termômetro de como será o mercado imobiliário.

Desta forma, diante desse cenário desacelerado, projetos sobre distrato na compra de imóveis são diariamente debatidos em comissão por Senadores que avaliam a interpretação mais favorável a construtoras do que ao consumidor.

Ressalta-se que no Brasil ainda não há qualquer regulamentação no que tange os distratos na compra de imóveis, e isto têm sido fonte de longas batalhas judiciais entre compradores e construtoras no Brasil, e por isso, o tema está em tramitação no Senado, onde não encontrou consenso dos parlamentares.

O Projeto de Lei da Câmara (PLC) 68/2018 que define as regras para a desistência da compra de imóvel na planta, foi inicialmente rejeitado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).

No entanto, um dos recursos levou a discussão para o Plenário, onde o texto recebeu 13 novas emendas.

A maioria das emendas são da Senadora Simone Tebet (MDB-MS), que foi uma das defensoras de mudanças no texto durante a votação preliminarmente rejeitada.

Assim ela afirma: — “É um projeto que diz que vem garantir, através do marco regulatório, a segurança jurídica numa relação contratual entre comprador e vendedor, bem como coibir abusos especialmente de especuladores do ramo imobiliário. Mas todas as motivações são desmontadas quando nós lemos um a um os dispositivos, artigos, parágrafos e incisos deste projeto”.

Na opinião da Senadora, a proposta tende a ser mais favorável às construtoras, e a maioria absoluta de quem financia um imóvel são cidadãos bem intencionados: — “Ainda que os especuladores correspondam, no montante, a 5% de tudo o que é contratualizado nessas relações, nós não estamos aqui para legislar pela exceção; nós estamos aqui para legislar pela regra”.

A Senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) é outra que criticou o projeto. Segundo ela, o texto inicial do deputado Celso Russomano (PRB-SP) foi desfigurado durante a tramitação na Câmara dos Deputados: — “Em benefício de quem? Em benefício do mutuário, daquele que está perdendo o emprego? Não! Esse projeto aqui prevê apenas a proteção do construtor, lamentavelmente”.

Em contrapartida o Senador Romero Jucá (MDB-RR) defendeu o texto. Na opinião dele, não se trata de beneficiar as empresas, pois é um projeto que protege a sociedade brasileira que precisa comprar imóveis de construtoras que concluam suas obras.

Assim afirmou o Senador durante a fase de discussão do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 68/2018: — “O que estamos vendo hoje é uma situação de quebradeira no setor imobiliário, uma situação extremamente grave, e isso compromete não só quem quer devolver o imóvel, compromete aquele que comprou um imóvel que a construtora não entrega porque não conclui a obra. Nós vimos isso já em várias situações. Eu queria lembrar o caso da Encol, que foi o mais grave deles”.

Desta forma, entre as emendas apresentadas agora em Plenário que serão analisadas pelo relator da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), está uma para dar mais clareza quanto às obrigações contratuais do incorporador e do adquirente.

Ou seja, determinar a inserção de um quadro-resumo no início do contrato, com as principais obrigações assumidas.

Esse quadro deverá ter informações como preço, taxa de corretagem, forma de pagamento, índice de correção monetária, taxas de juros e as consequências do desfazimento do contrato. Com isso, incorporador e comprador não mais poderão alegar desconhecimento das principais obrigações contratadas.

Há ainda emendas de redação, de alterações de prazos, de proteção de contratos já celebrados e outras para reequilibrar os direitos e obrigações entre contratante e contratado.

Pois bem, mas não podemos deixar de destacar a existência de outro projeto que se discute sobre o distrato, o PLS 288/2017, do Senador Dalirio Beber (PSDB-SC).

Tal projeto é relatado pelo Senador Armando Monteiro (PTB-PE), o texto está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e foi apontado por alguns parlamentares como mais equilibrado em relação aos interesses dos consumidores e incorporadoras.

Conclusivamente, o PLC 68/2018 prevê sanar a ausência de regulamentação no país quanto os distratos na compra de imóveis, para que evite o alastramento de longas batalhas judiciais entre compradores e construtoras no Brasil.

No que tange ao atraso, atualmente temos que a demora de até 180 dias para a entrega do imóvel não gerará ônus para a construtora – cláusula de 180 dias reconhecida previamente pelo Superior Tribunal de Justiça.

Em contrapartida, se tal atraso na entrega das chaves for maior a esse lapso temporal, o comprador poderá desfazer o negócio e terá direito a receber tudo o que pagou de volta, além da multa prevista em contrato, em até 60 dias.

Além do atraso, o PLC 68/2018 prevê permitir que as construtoras fiquem com até 50% dos valores pagos pelo consumidor em caso de desistência da compra, quando o empreendimento tiver seu patrimônio separado do da construtora (mecanismo chamado de patrimônio de afetação).

Com o patrimônio afetado, as parcelas pagas pelos consumidores não se misturam ao patrimônio da incorporadora ou construtora e, se ela entrar em dificuldades financeiras, não poderá fazer parte da massa falida.

Para os demais casos, leia-se, fora do patrimônio de afetação, a multa prevista para o consumidor será de até 25%, o que o Judiciário hoje costuma decidir entre 10% e 25% para o valor da multa.

Alternativamente, prevê o PLC 68/2018 que quando o comprador desistir, e consequentemente, apresentar um interessado em ficar com o imóvel, não haverá retenção da pena contratual, desde que a incorporadora dê a anuência na operação e o novo mutuário tenha seu cadastro e capacidade financeira aprovados.

O que de antemão não parece um cenário favorável para os consumidores, afinal, as construtoras não possuem, na maioria das vezes, interesse nessa operação.

Por fim, o PLC 68/2018 prevê que se a compra tiver sido feita em estandes de venda ou fora da sede do incorporador, o direito de arrependimento poderá ser exercido em sete dias, contados da compra, com a devolução de todos os valores eventualmente antecipados, inclusive da comissão de corretagem.

Tal previsão vai contra a decisão de Recurso Repetitivo do STJ que autoriza a transferência de valores de comissão de corretagem ao promitente comprador / consumidor.

Agora, se o comprador não se manifestar em uma semana (sete dias), o contrato será considerado irretratável.

Desta forma, podemos concluir que o PLC 68/2018, apresentam teses favoráveis para o promitente comprador em alguns momentos, autorizando o direito de arrependimento em sete dias, por exemplo, no entanto, em sua grande maioria, favorece os interesses das construtoras.

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